Manual de crise não resolve a crise

Por Denise de Moura - 01/10/2020

Mesmo que tentássemos, não conseguiríamos montar um manual de crise que cobrisse todas as possíveis vulnerabilidades ou riscos que uma organização venha a enfrentar ou que tem enfrentado com a pandemia da COVID-19. Entretanto, é possível sim aprender e se fortalecer a partir de crises anteriores, mesmo que estas sejam diferentes das atuais.

Os pesquisadores Erica Seville e Richard Ball, da Nova Zelândia, entrevistaram diretores de organizações e setores diversos (transporte, mineração, banco, educação, saúde, varejo, governo dentre outros), visando tirar lições aprendidas das crises que vivenciaram.

Estas crises não estão diretamente ligadas à COVID-19, mas a Nova Zelândia foi um dos países que deu exemplos extraordinários de resiliência, capacidade rápida de resposta e enfrentamento de crise sem precedente. Suas ações enérgicas foram responsáveis pelo pequeno número de infectados, quando comparado a de outros países.

Assim, algumas ações são sugeridas pelos pesquisadores que podem contribuir com organizações de setores e portes diferentes:

1) Esteja preparado – a identificação de riscos, por parte de uma organização, não a assegura que ela enfrentará, com assertividade, possíveis crises. Estar preparado diz respeito a que todos da cadeia produtiva de uma organização entendam, compreendam e tenham testado diversas vezes os planos de mitigação e resposta aos riscos, treinando e praticando diversos cenários. Um exemplo são os planos de contingência e simulações sistemáticas que as empresas fazem de combate a incêndios. E, ainda assim, não é possível dizer se as pessoas reagirão conforme o planejado. Desta forma, esta preparação envolve, além de muita capacitação, trabalhar os modelos mentais, transformando a resposta rápida e coletiva a um evento de crise, em um valor organizacional.

2) Dê responsabilidades, clareza das delegações e limites que cabem a cada um no momento da crise. O foco deve estar na resposta rápida à crise, tomando como base a preparação, a simulação e os valores mencionados anteriormente. E cada pessoa, dentro de uma organização, precisa compreender o seu papel neste processo.

3) Mantenha relações de confiança e coerência entre discurso e prática em seus relacionamentos com clientes, fornecedores, acionistas, funcionários. Isto contribuirá, sobremaneira, no momento da crise e no processo de recuperação. Muitas empresas com valores fortes e que têm relacionamentos duradouros com seus stakeholders, têm conseguido sair mais rápido de uma crise. A ajuda mútua, até mesmo entre empresas, “concorrentes”, tem feito toda a diferença neste momento.

4) Seja ágil na tomada de decisão durante uma crise. Mas isso só será possível, se cada pessoa compreender como pode colaborar nestes momentos. Caso contrário, o que será visto são diretores, presidentes, gestores e funcionários “batendo cabeças” para não se “afundar” perante uma crise.

5) Prepare-se para o longo prazo. Muitas crises têm ramificações muito maiores do que se imagina. Cabe à direção da empresa, conduzir a organização com um olhar de futuro, monitorando constantemente a saúde organizacional que possibilitará um futuro sustentável.

6) Tenha um cuidado extra quanto à saúde e segurança das equipes nos momentos de crise. Reduzir o maior número de danos aos funcionários e a todos os envolvidos na cadeia produtiva é dever e responsabilidade dos diretores das organizações.

Como afirmam os pesquisadores, a atual crise da COVID-19 mostrou que o pensamento focado na ação sobre como lidar com a próxima crise tem que estar na pauta dos planos estratégicos das organizações e, a clareza sobre como lidar de forma rápida com uma crise, sobretudo por parte da direção da empresa, fará toda a diferença.


A pesquisa completa pode ser acessada no site: https://www.resorgs.org.nz/a-boards-role-in-a-crisis/